terça-feira, 18 de abril de 2017




“Já são em número demasiado os que vieram ao mundo para combater e separar. (...) Aceitemos como o melhor que foi possível tudo o que nos apresenta o passado; mas procuremos que seja outra a atitude que tomarmos; lancemos sobre a terra uma semente de renovação e de íntimo aperfeiçoamento. Reservemos para nós a tarefa de cumprir e unir; busquemos em cada homem e em cada povo e em cada crença não o que nela existe de adverso, para que se levantem as barreiras, mas o que existe de comum e abordável, para que se lancem as estradas da paz; empreguemos toda a nossa energia em estabelecer um mútuo entendimento; ponhamos de lado todo o instinto de particularismo e de luta, alarguemos a todos a nossa simpatia. Reflictamos que são diferentes os caminhos que toma cada um para seguir em busca da verdade, em que muitas vezes só um antagonismo de nomes esconde um acordo real”


Agostinho da Silva, Por um fim de Batalha, Considerações 1944, in Textos Filosóficos I, p.117

sábado, 15 de abril de 2017

Páscoa na Luz

(Cristo lebre)


Páscoa!

Tempo de reflexão.

Para os cristãos é sinónimo de Ressurreição. Jesus morto levanta-se do túmulo ao alvorecer, em corpo de luz.

É morto depois da Última Ceia, na Páscoa judaica (Pesach ou Pesaḥ)) quando se comemora a saída do Egipto e a liberdade do povo eleito.
E é comendo o cordeiro temperado com ervas amargas e acompanhado por pão ázimo, para lembrar os tormentos passados no Egipto, que Jesus celebra a Última Ceia. Nessa noite, segundo os Evangelhos, é preso, passa a Paixão até à morte na cruz na Sexta-feira, ressuscitando ao alvorecer do Domingo.


Entre nós, no Domingo, há o ritual da visita da Cruz a cada casa. É o momento de reunião das famílias, da alegria e doçura da época. Nas mesas as amêndoas, os ovos, os coelhos de Páscoa.

De onde vêm os ovos e os coelhos? Nada têm a ver com a simbologia cristã!!!

Das memórias ancestrais perduram os ritos antigos que tornam real a comunhão de crenças, pois o importante é Algo Maior, a noção profunda da transcendência no nosso Imaginário.

Comecemos pela data em que celebramos a Páscoa: é fixada no primeiro Domingo após a primeira Lua Cheia que segue 21 de Março. Assim, será a 22 de Março, se a Lua Cheia for na noite de 21, e o mais tardar a 25 de Abril. Não se trata da lua observada, mas de uma lua dita eclesiástica*.

Ora, o calendário lunar era o antigo calendário antes do gregoriano romano, calculado pelo sol.

Segundo Bede (673-735), o mês de Abril era Eosturmonath, agora traduzido por “mês pascal”, mas que anteriormente era dedicado a Eostre (Ostara) festejada neste mês. Segundo Grimm era “uma divindade do alvorecer radiante, da luz primaveril, um espectáculo que traz alegria e bênçãos” Eostre é o aspecto nórdico da Grande Deusa Mãe. Anuncia a germinação ou por outros termos a ressurreição da Terra.

Os ovos, e por comparação as amêndoas, a lebre ou o coelho, eram símbolos de Eostre, uma evidência, uma vez que ela era a Deusa da Fertilidade.

Mais tarde, quando se impôs o cristianismo, e segundo a Enciclopédia Católica “porque o uso de ovos era proibido durante a Quaresma, eram levados à mesa no dia de Páscoa, pintados de vermelho simbolizando a alegria da Páscoa”.

Do coelho, animal lunar, símbolo da fertilidade por excelência aparece já na Antiguidade, 3500 AC. Inicialmente havia referências a uma lebre, símbolo da abundância, proliferação e renovação, animal presente em várias tradições pelo mundo. Por exemplo, no Islão, Ali, o descendente do Profeta, apresenta-se sob a aparência de uma lebre simbolizando o filho sacrificado. A ideia de sacrifício divino simbolizado pela morte da lebre está igualmente presente no budismo: o boddhisattva toma a aparência de uma lebre para se lançar nas chamas. Igualmente, é uma lebre que se imola pelo fogo para alimentar o Buda quando este tem fome.


Nesta Páscoa que vivemos, em que aliamos símbolos antigos e os actualizamos a cada ano, talvez mais uma mensagem se torne evidente: o Tempo reúne o que antes separou, deixando manifestar-se a Unicidade da Vida, independentemente dos cultos, das crenças, das lutas religiosas.

Somos intrinsecamente Seres em Busca da Luz.

Boa Páscoa A TODOS.


* A Lua Eclesiástica ou Lua Pascal é uma representação fictícia das fases da Lua real. Desde o Concílio de Niceia em 325 que os cálculos se baseiam no ciclo metónico para determinar a data da Páscoa. Segundo Meton, 235 meses lunares correspondem exactamente a 19 anos trópicos. Utilizando-se o calendário juliano, a cada 19 anos as fases da Lua vão cair nos mesmos dias do calendário.