Ontem alguém falava da ingratidão das pessoas. Na verdade caímos no hábito
de nos queixarmos a outrém, esperando ser ouvidos, consolados, compreendidos e
outros afagos que fazem tão bem. De pé novamente, já melhor, esquecemos que
alguém, um dia ou vários, nos acolheu no seu coração, lambeu as nossas feridas,
doou o seu tempo, se interessou, enfim ...amou. Partimos sem querer saber mais
se essa pessoa sentirá a necessidade de ouvir “valeu a pena conhecer-te” ou “
foste importante” ou ainda simplesmente “Bem-hajas!”... deixamos o vazio no
outro!
A doação, o Amor no sentido mais puro, não necessita de reconhecimentos.
Dá-se simplesmente! Quem dá é que mais
recebe, diz a sabedoria popular e com razão. Pela Lei do Retorno ou Karma tudo
se recebe de volta, aquilo que doou, fez ou pensou, seja bom ou menos bom.
Assim, quem recebeu amor e não doou está a constituir uma “dívida” algures,
dívida essa que um dia será cobrada.
A língua portuguesa tem uma palavra que retrata esta realidade: obrigado!
Dizemo-la sem reflectirmos sobre o seu significado. Segundo o dicionário, uma
obrigação é um “direito de crédito”, ou seja se recebemos ficamos a dever algo.
Quer seja dito ou simplesmente devido, a verdade é que sempre que recebemos
ficamos em dívida.
No Pai Nosso, oração por demais conhecida entre os cristãos, na sua versão
anterior dizia a determinado momento “Perdoai as nossas dívidas, assim como nós
perdoamos aos nossos devedores”. Tem dois aspectos esta afirmação.
O primeiro é o facto da dívida ou obrigação, que todos assumimos num ou
noutro momento. Não creio que as dívidas referidas no Pai Nosso tenham o
aspecto monetário ou económico. São dívidas de outra estirpe: o acto, a
palavra, sejam quais forem; refere a doação, o estender a mão, a ajuda, ou os
seus contrários.
O segundo aspecto muito importante é o perdão. Só com ele a dívida fica
saldada (em caso de não pagamento). Não creio que este perdão seja altaneiro, o
perdão daquele que é senhor e, num acto de orgulho, concede o perdão. Intuo que
o perdão do Pai Nosso é um acto de Amor, vem do coração, sem nada esperar (nem mesmo
a gratidão).
Duas palavras ressaltam: Perdão e Amor. Quem perdoa sabe amar. Quem ama está
grato, não por dívida mas antes como cântico e louvor à própria Vida. É o ascender
a algo que está para além do dizer ou do fazer, é do domínio celeste, o Inominável
e Indizível, onde o sentir ou fazer não existem, apenas se É ... Amor!
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